Mostrando postagens com marcador Livros e filmes da literatura brasileira. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Livros e filmes da literatura brasileira. Mostrar todas as postagens

terça-feira, 26 de agosto de 2014

O BARCO TREME

Publicado em  emRealidadeUncategorized

O barco vibra. É assustador porque só tem oceano para todos os lados e ninguém para ajudar. Você olha para a água por um momento, temendo que o barco vire enquanto você se movimenta. A água é escura como o oceano Antártico. Se perder na imensidão negra parece algo como o limbo e você teme que possa afundar pela eternidade e sentir esta eternidade. O inferno.
O barco não para de vibrar e, mesmo estando na superfície, você teme afundar lembrando da sensação de afogamento gelado que já experimentou antes e quase morreu. A água que invadia seu corpo como um espírito maligno e não lhe deixava morrer em paz, nem viver.
O barco treme e você nem mesmo sabe porquê. O mais incômodo é a sensação de meio-termo, o barco não afunda, mas também não está estável. Você ainda pode morrer, sozinho.
Você começa a desejar que não tivesse ido pescar tão longe e então você dorme. E espera que o dia seguinte seja melhor.
By http://naoultrapassado.wordpress.com/

terça-feira, 19 de agosto de 2014

Minha Culpa é te Amar

Livro:
Minha Culpa é te Amar
Ano: 2014
Gênero: Romance
Duas amigas, dois mundos diferentes que se unem encontrando o amor verdadeiro em meio à traição... Beatriz e Alicia são diferentes em todos os aspectos, mas isso não impede de se tornarem inseparáveis. Vivendo uma linda amizade entre o cálido Rio de Janeiro e a fria Dublin (Irlanda) até que algo muito grave acontece, colocando em risco essa linda amizade. Será que uma verdadeira amizade suportará tamanha traição? É uma prova de fogo entre o amor verdadeiro e uma amizade sincera. Até que ponto chegará essa amizade? ...

  • sábado, 18 de janeiro de 2014

    Dom Casmurro”, de Machado de Assis

    Dom Casmurro”, de Machado de Assis

    by Fernanda Jimenez
    (...) Talvez abuso um pouco das reminiscências osculares; mas a saudade é isto mesmo; é o passar e repassar das memórias antigas. Ora, de todas as daquele tempo creio que a mais doce é esta, a mais nova, a mais compreensiva, a que inteiramente me revelou a mim mesmo. (Dom Casmurro lembrando do seu primeiro beijo com Capitu)
    Eu não sei se pode ser chamada de "resenha" esses textos que escrevo sobre os livros que leio. Vou anotando o que penso e os trechos das obras conforme vou lendo. Os textos acabam ficando fragmentados e sem muita coesão, mas é assim que gosto de fazer....escrevo o que vai surgindo durante a leitura. Vamos lá...se você gosta de literatura brasileira, uma obra imprescindível na sua lista de leituras é "Dom Casmurro" (1899), editado pelos irmãos Garnier, dois franceses radicados no Rio de Janeiro. Machado de Assis não pode faltar na biblioteca de todo bom leitor.
    machado-de-assis
    Machado de Assis
    Joaquim Maria Machado de Assis (Rio de Janeiro, 21 de junho de 1839 - Rio de Janeiro, 29 de setembro de 1908). A história de Machado é incrível: ele era pouco escolarizado, não frequentou universidade, era de família pobre, era mulato (naquela época motivo de discriminação), mas ele nadou contra a maré e venceu. Foi auto- didata, erudito, escreveu todos os gêneros literários, trabalhou no Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, escreveu para jornais, foi tipógrafo, revisor e foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras e o primeiro presidente eleito por unanimidade. Seu talento incontestável abriu- lhe todas as portas. Casou-se com a portuguesa Carolina Augusta Xavier de Novais (Porto, 1835 - Rio de Janeiro, 1904) que era muito culta e inclusive o ajudava a escrever e revisar os textos de Machado. Carolina e Machado não tiveram filhos, ficaram casados por 34 anos. O escritor ficou viúvo em 1904 e escreveu esse poema em homenagem à esposa:
                A Carolina
    Querida! Ao pé do leito derradeiro,
    em que descansas desta longa vida,
    aqui venho e virei, pobre querida,
    trazer-te o coração de companheiro.
    Pulsa-lhe aquele afeto verdadeiro
    que, a despeito de toda a humana lida,
    fez a nossa existência apetecida
    e num recanto pôs um mundo inteiro...
    Trago-te flores - restos arrancados
    da terra que nos viu passar unidos
    e ora mortos nos deixa e separados;
    que eu, se tenho, nos olhos mal feridos,
    pensamentos de vida formulados,
    são pensamentos idos e vividos.
    170px-Carolina_Amor_de_Machado
                                                Carolina Augusta Xavier de Novais
     De saúde frágil segundo muitos biógrafos, sofria ataques epiléticos, problemas nervosos, problemas de visão e também era gago. O que o torna ainda mais admirável. Dizem as más línguasque Machado teve um caso com a esposa de José de Alencar e que tiveram um filho juntos. Também dizem por aí que Machado conta a história dessa traição em Dom Casmurro. O escritor morreu por causa de um câncer na boca possivelmente provocado pelos tiques que sofreu durante toda a sua vida.
     "Dom Casmurro"(1899) é dividido em 148 capítulos curtos. É começar a ler e não conseguir mais parar até o final. A história deDom Casmurro, quer dizer, de Bentinho e sua amada Capitu, narrado pelo próprio protagonista, é uma das mais incríveis histórias de amor já escritas. A intensidade do primeiro amor:
    Eu amava Capitu! Capitu amava- me! E as minhas pernas andavam, desandavam, estacavam, trêmulas e crentes de abarcar o mundo. Esse primeiro palpitar da seiva, essa revelação da consciência a si própria, nunca mais me esqueceu, nem achei que lhe fosse comparável qualquer outra sensação da mesma espécie. Naturalmente por ser minha. Naturalmente também por ser a primeira.  Capítulo 12,  "Na varanda")
    Bentinho ou "Dom Casmurro", apelido que ganhou e foi explicado o motivo no início da obra, descreve  Capitu ("Capitolina"), sua amiga de infância e vizinha, assim:
    Não podia tirar os olhos daquela criatura de quatorze anos, alta, forte e cheia, apertada em um vestido de chita, meio desbotado. Os cabelos grossos, feitos em duas tranças, com as pontas atadas uma à outra, à moda do tempo, desciam- lhe pelas costas. Morena, olhos claros e grandes, nariz reto e comprido, tinha a boca fina e o queixo largo. (Capítulo 13: "Capitu")
    Capitu e Bentinho tinham uma relação muito especial, entendiam- se sem palavras. O futuro padre e a amada sofriam pelo futuro próximo, onde Bentinho entraria num seminário. A mãe de Bentinho obrigou- o a entrar no seminário, apesar da recusa do rapazinho e da revolta de Capitu, era uma promessa e ela tinha que cumprir. Bentinho não tinha vocação para ser padre e tentou de tudo para que sua mãe desistisse da ideia. Pediu ao agregado da família José Dias e à prima Justina que o ajudasse a convencer a sua mãe, Glória. A prima negou logo, disse que era impossível convencer a Glória. Bentinho saiu ao Passeio Público com José Dias para ver se ganhava um aliado. José olha os vizinhos Pádua com reserva, veja o que ele pensa de Capitu, umas das passagens mais conhecidas da obra (Capítulo 25):
    Capitu, apesar daqueles olhos que o Diabo lhe deu...Você já reparou nos olhos dela? São assim de cigana oblíqua e dissimulada. Pois, apesar deles, poderia passar, se não fosse a vaidade e adulação. Oh! a adulação!
    José Dias prometeu ao rapaz que tentaria dissuadir dona Glória. Vários capítulos Bentinho passa com essa dúvida, "mamãe atenderá meu pedido?". Bentinho queria mesmo era ser médico. Capitu preferia qualquer coisa, menos o seminário, inclusive preferia que Bentinho fosse estudar na Europa. Bentinho foi até o quarto da menina, lembrou da definição de José Dias sobre os olhos de Capitu e decidiu dar a sua: "olhos de ressaca"- ressaca do mar, não a ressaca depois de uma bebedeira (capítulo 32):
    Traziam não sei que fluido misterioso e energético, uma força que arrastava para dentro, como a vaga que se retira da praia, nos dias de ressaca. Para não ser arrastado, agarrei- me às outras partes vizinhas, às orelhas, aosbraços, aos cabelos espalhados pelos ombros; mas tão depressa buscava as pupilas, a onda que saía delas vinha crescendo, cava e escura, ameaçando envolver-me, puxar- me e tragar- me.
    O beijo acontece no capítulo 33. Emocionante, atordoado, vertiginoso. A partir daí, o menino de 15 anos começou a sentir- se homem. O namoro escondido e o desejo de contar à mãe a falta de vocação eclesiástica. E o casalzinho sofre a dor da separação, fazem promessas, mas não de amor, mas de resignação. Bentinho pediu que Capitu prometesse duas coisas: que ela só se confessaria com ele e que fosse ele o padre a casá- la. E ela acrescentou ainda mais uma promessa, que seria Bentinho que batizaria o seu filho. Tudo isso dito com dor e uma certa ironia. Fizeram as pazes e Capitu jurou que jamais casaria com ninguém; e Bentinho jurou que só casaria com ela. E no final, ambos juraram que só casariam um com o outro, com o céu por testemunha. E Bentinho seguiu para o seminário de São José debaixo de muito choro.
    Ia ser poeta, ia competir com aquele monge da Bahia, pouco antes revelado, e então na moda; eu, seminarista, diria em verso as minhas tristezas, como ele dissera as suas no claustro. (cap. 55)
    Aos sábados, Bentinho voltava para casa e continuava a ver Capitu, mas com prudência, dissimulavam o amor para não levantar suspeitas e assim poder construir seus planos de futuro, que incluía a saída de Bentinho do seminário. Nesse tempo em que Bentinho ficou fora, Capitu e a dona Glória fizeram- se muito amigas, Capitu ia lá costurar de manhã e ficava até a hora do jantar. Foi quando dona Glória ficou muito doente e Capitu foi logo cuidá- la. A mãe de Bentinho ficou muito mal e passou pela cabeça do rapaz que se ela morresse acabaria o seminário. Morreu de remorso por tal pensamento, queria contar tudo à mãe e fez uma promessa que rezaria mil Pai- nossos para que ela ficasse boa. E ficou, ufa! Bentinho começou a imaginar planos de se livrar do seminário junto ao seu grande amigo Escobar e o amigo da família José Dias. Promessa difícil essa de dona Glória, por uma doença na infância do filho, prometeu a Deus entregar Bentinho à Igreja. Mas Bentinho conseguiu abandonar o seminário com dezessete anos para estudar Direito até os vinte e dois. Escobar também saiu do seminário e casou- se com Sancha, a amiga- irmã de Capitu.
    Bentinho e Capitu casaram- se, por fim, em 1865o capítulo sobre o casamento é um dos mais bonitos:
    (...) uma tarde de março, por sinal que chovia. Quando chegamos ao alto da Tijuca, onde era o nosso ninho de noivos, o céu reconheceu a chuva e acendeu as estrelas, não só as conhecidas como as que só serão conhecidas daqui a muitos séculos. (cap. 101)
    Depois de dois anos de casados, Capitu e Bentinho ainda não tinham conseguido ser pais, como ambos desejavam e pediam em oração. Escobar e Sancha tiveram uma menina e deram o nome de Capitu, "Capituzinha". O menino dos nossos protagonistas acabou chegando, Ezequiel. Escobar morreu afogado nadando no mar bravo. Bentinho sentiu uma atração sexual por Sancha. Não poderia ter acontecido o mesmo entre Capitu e Escobar? Todas as sutis pistas na obra indicam que Capitu traiu Bentinho com Escobar. Ezequiel seria filho de Capitu e Escobar. Bentinho notava semelhanças na criança com o defunto amigo, tinham os mesmos olhos e gestos parecidos. Bentinho via Escobar quando olhava para o menino, que ia crescendo e aumentando mais ainda a semelhança. Bentinho vivia atormentado com esse fato, tanto, que por pouco não cometeu suicídio bebendo um café envenenado. Tal traição, dizem, teria acontecido na vida real com o Machado e a esposa do amigo José de Alencar, ambos teriam tido um filho. Onde há fumaça há fogo, não? Eu não acredito em coincidências. A pergunta não é "Capitu traiu mesmo Bentinho?", a pergunta é "Valeu à pena tanto ciúmes, Dom Casmurro?"
                                         Deus é grande e descobre a verdade.(cap.52)
    Prestem atenção no capítulo "Os vermes", é muito interessante, é uma parábola de uns vermes que ferem-se, mas têm o poder da auto- cura.
    Esta sarna que é escrever, quando pega aos cinquenta anos, não despega mais. (cap. 54)
    descarga
    Assis, Machado. Dom Casmurro. Murano, 2009 (ebook).


    terça-feira, 19 de novembro de 2013

    Resenha: “Grande Sertão: veredas”

    Resenha: “Grande Sertão: veredas”, João Guimarães Rosa, no dia da morte do escritor

    Eu quase que nada não sei. Mas desconfio de muita coisa.( p. 30)
    Eu também desconfio de muita coisa, até dessa incrível “coincidência”, postar ao acaso essa resenha (cheia de “anotamentos”) justo hoje: data do falecimento de Guimarães Rosa. A vida é mesmo mística.
    O escritor, ministro, diplomata e médico João Guimarães Rosa (Cordisburgo, Minas Gerais, 27 de junho de 1908 - Rio de Janeiro, 19 de novembro de 1967) foi também membro da Academia Brasileira de Letras, ocupou a cadeira nº 2, eleito em 6 de agosto de 1963. Morreu precocemente de enfarto, morte misteriosa e anunciada. Ele recusou- se a tomar posse na Academia Brasileira de Letras, porque disse que se o fizesse iria morrer. Acabou cedendo quatro anos depois e entrou para a Academia. No seu discurso de posse falou: “A gente não morre. Fica encantado”. Sua premonição/ profecia se cumpriu e três dias depois da posse, Rosa faleceu. Arrepia, não?!
    “O grande sertão: veredas”, uma autobiografia irracional, palavras do próprio autor foi dedicado à sua esposa Aracy Guimarães Rosa, sua segunda esposa (ela merece um post à parte) trabalhou no consulado de Hamburgo na época do Holocausto e ajudou a enviar ilegalmente judeus ao Brasil. Foi uma grande mulher. Faleceu aos 102 anos no dia 3 de março de 2011. Aracy e Rosa viveram por 30 anos a sua história de amor.
    ARACY2
    (…) Era assim: eu ia indo, cumprindo ordens; tinha de chegar num lugar , aperrar as armas; acontecia o seguinte, o que viesse vinha; tudo não é sina? (p. 220)
    images-21
    Aracy, “Ara”, era paranaense, é a única mulher mencionada no Museu do Holocausto, em Israel e nos Estados Unidos por sua ajuda na fuga de judeus. Foi uma mulher valente e admirável!
    O intelectual…Foto Guimarães Rosa _ 01
    …e o homem do campo, sertanejo:kovadloff-guimaraes20rosa204
    A posse na Academia Brasileira de Letras:
    Guimarães Rosa, 3
    Um post é ínfimo para tentar falar sobre a grandeza desse livro. Grande sertão: veredas é a obra- prima de Guimarães Rosa e um patrimônio da literatura brasileira. Não é uma leitura fácil a princípio, ler Rosa é bastante intenso, dentro da “simplicidade complexa” do falar do homem sertanejo, que muita gente pode necessitar de um dicionário à parte, pois é um léxico que a maioria do povo da cidade não domina. A primeira palavra do primeiro parágrafo é “nonada”, que é de origem crioula, significa “insignificante”, “pouco”, não é um neologismo como já li por aí. A ordem lexical da obra é caótica, oral, as frases são desconstruídas. Contudo, o cérebro se acostuma e a leitura começa a deslizar “fácil”, é rica, divertida, surpreendente. O cenário cheira  à natureza, ao rio Urucúia, ao sertão mineiro e ao baiano, às agruras da terra seca. Os personagens retratados no seu habitat, sem correções gramaticais, com suas superstições, mil seres estranhos e endemoniados, mas isso não impede que estejam impregnados de sabedoria, onde se fazem presentes Deus e o Diabo, os saberes da vida,  o plantar e o colher, o tempo, a vida e a morte, os segredos da fauna e da flora, um povo místico que acredita na magia da vida. E os neologismos, como “fantasiação”, “estranhez”, “desenormes”, “afamilhado”, “demudou”, “babeja”, “nuelo”, “gasturado”, “duvidação”, “deslúa”, “conhecença”, “tãomente”, “vivimento”…são uma atração à parte, tente imaginar o que significa cada uma delas. Os tradutores dessa obra devem ter arrancado os cabelos. Esse livro não é nada previsível, existe uma certa fragmentação, se você pular algum trecho vai fazer falta no decorrer da leitura, cada parágrafo é essencial. O narrador é Riobaldo, que um dia foi jagunço, conversa com o compadre Quelemém, homem “estudado”, amigo, mas forasteiro, por isso achou bom contar a sua história, já que o homem iria embora mesmo. Quelemém é um ouvinte mudo durante todo o romance e ouve atentamente todos os “causos” do amigo jagunço. Riobaldo é um filósofo do sertão, suas falas são carregadas de sabedoria. Fiz uma seleção de citas:
    O senhor não duvide- tem gente neste aborrecido mundo, que matam só para ver alguém fazer careta… (p.28)
    O que mais penso, testo e explico: todo-o-mundo é louco. O senhor, eu, nós, as pessoas todas. Por isso é que se carece principalmente de religião: para se desendoidecer, desdoidar. Reza é que sara da loucura. (p. 32)
    Viver é muito perigoso…Querer o bem com demais força, de incerto jeito, pode já estar sendo se querendo o mal, por principiar. (p. 32)
    Deus é paciência. O contrário, é o diabo. (p. 33)
    Por enquanto, que eu penso, tudo quanto há, neste mundo, é porque se merece e se carece. (p. 33)
    Me fez um receio, mas só no bobo do corpo, não no interno das coragens. (p. 34)
    Sertão. O senhor sabe: sertão é onde manda quem é forte, com as astúcias. (p. 35)
    (…) O senhor sabe: há coisas de medonhas demais, tem. Dor do corpo e dor da idéia* marcam forte, tão forte como o todo amor e raiva de ódio. (p.37)
    (…) Eu confiro com mu compradre Quelemém,o senhor sabe: razão da crença mesma que tem- que, por todo mal, que se faz, um dia se repaga, o exato. (p. 38)
    (…) Mire veja: o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas- mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam. Verdade maior. É o que a vida me ensinou. Isso me alegra, montão. E, outra coisa: o diabo, é as brutas; mas Deus é traiçoeiro! Ah, uma beleza de traiçoeiro- dá gosto! A força dele, quando quer- moço! me dá até pavor! Deus vem vindo: ninguém não vê. Ele faz é na lei do mansinho- assim é o milagre. E Deus ataca bonito, se divertindo, se economiza. (p. 39)
    (…) E, alma, o que é? Alma tem de ser coisa interna supremada, muito mais do de dentro, e é só, do que um pensa: ah, alma absoluta! (p. 41)
    (…) Se sonha; já se fez… (p. 41)
    (…) Perto de muita água, tudo é feliz. (p. 45)
    Moço: toda saudade é uma espécie de velhice. (p. 56)
    O amor, já de si, é algum arrependimento. (p. 57)
    Para trás, não há paz. (p. 58)
    Guerra diverte- o demo acha. (p. 75)
    Viver é um descuido prosseguido. (p. 86)
    O senhor sabe: tanta pobreza geral, gente no duro ou no desânimo. Pobre tem que ter um triste amor à honestidade. (p. 88)
    Com Deus existindo, tudo dá esperança: sempre um milagre é possível, o mundo se resolve.. Mas, se não tem Deus, há- de a gente perdidos no vai- vem, e a vida é burra. É o aberto perigo das grandes e pequenas horas, não se podendo facilitar- é todos contra os acasos. Tendo Deus, é menos grave se descuidar um pouquinho, pois, no fim dá certo. (p. 76)
    Digo: o real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia. (p. 80)
    Despedir dá febre. (p.81)
    O sertão é do tamanho do mundo. (p. 89)
    Qual é o caminho certo da gente? Nem para frente nem para trás: só para cima. Ou parar curto quieto. Feito os bichos fazem. Os bichos estão só é muito esperando. Mas, quem e que sabe como? Viver… (p. 110)
    A lembrança da vida da gente se guarda em trechos diversos, cada um com seu signo e sentimento, uns com os outros acho que nem não se misturam. (p. 115)
    Ah, e se não fosse, cada acaso, não tivesse sido, qual é então que teria sido o meu destino seguinte? Coisa vã, que não conforma respostas. Às vezes essa idéia me pões susto. (p. 142)
    Homem como eu, tristeza perto de pessoa amiga afraca. Eu queria mesmo algum desespero. (p. 169)
    Medo de errar. Sempre tive. Medo de errar é que é a minha paciência. (p. 201)
     Ator - Atriz
    A Rede Globo de televisão (Brasil) produziu uma minissérie baseada em Grande sertão: veredas, protagonizada por Toni Ramos (Riobaldo) e Bruna Lombardi (Diadorim), exibida em 1985.
    A obra também é engraçada, os nomes dos personagens citados, as histórias são hilárias: Pedro Pindó, Valtêi (um nome considerado “muderno”),  Jisé Simpilício, Joãozinho Bem- Bem, Zé- Bebelo, Sô Candelário, Antônio Dó, Andalécio, Urutú- Branco, Jazevedão, Olivino Oliviano, Joé Cazuzo, Piolho- de- Cobra, Ana Duzuza, entre outros.
    Riobaldo começa a contar ao compadre Quelemém a sua amizade com Diadorim, filho de Joca Ramiro. Diadorim é o seu melhor amigo, mas ele sente uma atração inexplicável muito mais além de uma amizade, é paixão, amor. Jagunço e homossexual são coisas incompatíveis e isso o deixa agoniado :
    Diadorim  e eu, nós dois. A gente dava passeios. Com assim, a gente se diferenciava dos outros- porque jagunço não é muito de conversa continuada nem amizades estreitas: a bem eles se misturavam e desmisturavam, de acaso, mas cada um é feito um por si. De nós dois juntos, ninguém nada não falava. Tinham a boa prudência. Dissesse um, caçoasse, digo, podia morrer. (p. 44)
    Diadorim, duro sério, tão bonito, no relume das brasas. Quase que a gente não abria a boca; mas era um delém que me tirava para ele- o irremediável extenso da vida. Por mim, não sei que tontura de vexame, com ele calado eu a ele estava obedecendo quieto. (p. 45)
    (…) Quem sabe, podia ser, eu estava enfeitiçado? (p. 51)
    (…) meu amor inchou, de empapar todas as folhagens, e eu ambicionando de pegar Diadorim, carregar Diadorim nos meus braços, beijar, as muitas demais vezes, sempre.(p. 55)
    Noite essa, astúcia que tive uma sonhice: Diadorim passando debaixo de um arco- íris. Ah, eu pudesse mesmo gostar dele- os gostares… (p. 66)
    Meu corpo gostava do corpo dele (…) (p. 198)
    Riobaldo já idoso, também conta histórias da sua infância, de um passeio de barco no rio São Francisco quando menino, uma bela narrativa sobre a coragem e o medo; também sobre quando faleceu a sua mãe e ele foi morar com o padrinho rico, Selorico Mendes, foi só então que aprendeu a ler. Conta como começou a ser jagunço, o dia a dia dessa vida e os seus problemas de consciência.
    Desculpa me dê o senhor, sei que estou falando demais, dos lados. Resvalo. Assim é que a velhice faz. Também, o que é que vale e o que é que não vale? Tudo. (p. 160)
    Riobaldo era homossexual ou bissexual, pelo menos, já que também se apaixonou por uma mulher, Otacília (ou foi pela impossibilidade de consumar seu amor com Diadorim?):
    Ela era risonha e descritiva de bonita. (p.205)
    Toda moça é mansa, é branca e delicada. Otacília era a mais. (p. 206)
    Riobaldo sente atração por um homem, situação inaceitável num meio altamente machista/homófobo como era o do cangaço, o sertanejo “cabra- macho”. Ele viu  o amigo Reinaldo tomar banho no rio, tirou a roupa e iria tomar banho também, só que sentiu uma “alegria”. Ficou bravo consigo mesmo, vestiu a roupa. Contou ao compadre Quelemém, negou o óbvio, mas se contradisse ao mesmo tempo:
    Mas eu gostava dele, dia mais dia, mais gostava. Diga o senhor: feitiço? Isso. Feito coisa feita. Era ele estar perto de mim, e nada me faltava. (…) Era ele estar longe, e eu só pensava nele. (…) Acho que. Aquela meiguice (…) E em mim a vontade de chegar todo próximo, quase uma ânsia de sentir o corpo dele, dos braços, que às vezes adivinhei insensatamente- tentação dessa eu espairecia, aí rijo comigo renegava. (…) Conforme, por exemplo, quando eu lembrava daquelas mãos, do jeito como se encostavam em meu rosto, quando ele cortou meu cabelo. (p. 163)
    Foi Reinaldo que apresentou Joca Ramiro (pai de Diadorim) a Riobaldo. Reinaldo, na verdade, era o “menininho” corajoso que encantou Riobaldo na travessia do rio na infância deles. Reinaldo não se chama Reinaldo, seu nome verdadeiro é Diadorim. Diadorim não é homem, Diadorim é mulher, mas Riobaldo se apaixonou por ele (ou ela) pensando que era homem. Diadorim mudou de gênero desde criança, alma de menino preso num corpo feminino. Diadorim disse a Riobaldo:
    Mulher é gente tão infeliz! (p. 188)
    Zé Bebelo e Joca Ramiro eram rivais. Riobaldo era amigo de Bebelo e achava que ele tinha razão, mas estava apaixonado pelo filho de Ramiro, homem rico e cheio de posses. O que vai decidir Riobaldo? Que bando vai escolher? E Diadorim que não queria ser mulher, se apaixonou por Riobaldo? Ficaram juntos? E Otacília? Só lendo!
    Viver é muito perigoso, frase repetida muitas vezes durante toda a narrativa. É uma obra genial tanto na forma quanto no conteúdo. Todo ser humano, não só brasileiro, deveria ler essa obra!
    (…) minha idéia confirmou: que o Diabo não existe. Pois não? (…) Nonada. O diabo não há! É o que eu digo, se for…Existe é homem humano. Travessia. (p.624)
    grande-sertão-veredas
    Rosa, João G.. Grande sertão: veredas.  Nova Fronteira, São Paulo, 2005. 624 páginas
    *O editor preferiu manter a ortografia original que usou Guimarães Rosa, sem as correções da nova ortografia.

    quarta-feira, 30 de outubro de 2013

    A história do amor de Fernando e Isaura, Ariano Suassuna

    A história do amor de Fernando e Isaura, Ariano Suassuna

    Sou um escritor de poucos livros e poucos leitores. Vivo extraviado em meu tempo por acreditar em valores que a maioria julga ultrapassados. Entre esses, o amor, a honra e a beleza que ilumina caminhos da retidão,da superioridade moral, da elevação, da delicadeza, e não da vulgaridade dos sentimentos. (Recife, 7 de outubro de 1994, p. 20)
    Ariano-Suassuna-2
    O escritor na sua casa na Paraíba.
    Ariano Suassuna (João Pessoa, 16 de junho de 1927 ), membro nº32 da Academia Brasileira de Letras, marcou a minha adolescência e incrementou a minha paixão pela leitura. Li incontáveis vezes a peça “O auto da Compadecida” (1955), assisti a obra no teatro diversas vezes, e em todas elas, a gargalhada saía fácil. O humor de Suassuna lavava a minha alma. Chicó e João Grilo são os personagens mais hilários da literatura brasileira. Mas deixo “O auto da Compadecida” para outro post, nesse a estrela é “A história de amor de Fernando e Isaura”(1956), um dos poucos romances do autor que permaneceu inédito até 1994, quando foi publicado no Recife pela primeira vez. A maior parte da obra de Suassuna é composta por peças de teatro, mas também é escritor de prosa e verso.
    Nosso querido escritor anda meio adoentado e daqui mando o meu sincero desejo de pronto restabelecimento. O escritor tem um blog no UOL, com última atualização em 20 de junho, ele sofreu um infarto no último mês de agosto e recentemente cancelou a sua participação na Feira do Livro de Alagoas. Força, Ariano, nós te amamos!
    126671Ariano Vilar Suassuna, advogado, filho de Cássia Vilar e João Suassuna, assassinado no Rio de Janeiro por motivos políticos. Passou a infância na fazenda Acauhan que pertencia a seu pai, depois vendida pela viúva para que os seus nove filhos estudassem.
    O romance “A história do amor de Fernando e Isaura” é a versão brasileira da história deTristão e Isolda (lenda de origem celta), portanto, uma tragédia, não esperem por um final feliz. A leitura corre muito veloz, o livro é dividido em capítulos curtíssimos de duas, três páginas. Este livro serviu como prólogo, como exercício para escrever um romance que veio anos depois, “O romance d’a pedra do reino e o príncipe do sangue vai-e-volta”, escrito entre 1958 e 1970, doze anos de escritura. A paisagem é rural, acontece na fazenda São Joaquim, entre Penedo e Piassabussu (Alagoas), entre a praia e o Rio São Francisco. Marcos Fonseca, o dono da fazenda, é viúvo e  tio de Fernando, pobre e órfão, o tio o acolheu ainda menino com a morte de sua irmã, Riva. A vida solitária dos dois era marcada por muito trabalho na fazenda. Marcos arranjou um casamento com uma moça muito mais jovem que ele, Isaura. Já não vou contar muito mais sobre a história, já deu para imaginar, não? Só vou contar que Fernando já conhecia Isaura por um episódio do passado. Isaura, de uma beleza perfeita, de olhos claros e um cabelo fino dourado. Seus pensamentos estavam povoados da imagem de Fernando. Desde que o avistara, seu sangue e seu coração tinham criado alma nova.(p. 46) Entre encontros e desencontros, o amor vai cumprindo a sua profecia.
    Quem pode contra a força do Destino?
    ArquivoExibir
    Suassuna, Ariano. A história de amor entre Fernando e Isaura.  José Olympio, Rio de Janeiro, 1994. 174 páginas

    terça-feira, 1 de outubro de 2013


    Morte e Vida Severina em Desenho Animado é uma versão audiovisual da obra prima de João Cabral de Melo Neto, adaptada para os quadrinhos pelo cartuinista Miguel Falcão. Preservando o texto original, a animação 3D dá vida e movimento aos personagens deste auto de natal pernambucano, publicado originalmente em 1956.
    Em preto e branco, fiel à aspereza do texto e aos traços dos quadrinhos, a animação narra a dura caminhada de Severino, um retirante nordestino, que migra do sertão para o litoral pernambucano em busca de uma vida melhor.

    Morte e Vida Severina – João Cabral de Melo Neto, Afonso Serpa (direção) e Michel Falcão (arte)

    Produzido pela Fundação Nabuco e TV Escola

    Debaixo da Mesma Lua, Uma historia de amor e Vinhos

    Debaixo da Mesma Lua, Uma historia de amor e Vinhos Vem comigo na construção de um lindo romance. Vou compartilhar vários trechos desse roma...